domingo, 24 de maio de 2009

Balangandã moderno

A primeira vez que escutei a paulista Ná Ozzetti, além da voz linda e afinadíssima, me impressionou a escolha do repertório. O disco, o debut, de 1988, trazia alguns das versões mais bacanas e revolucionárias que já ouvi de clássicos da MPB, como “Sua Estupidez”, de Roberto e Erasmo, e “No Rancho Fundo”, de Ary Barroso, e até do cancioneiro brega italiano, a exemplo de uma inacreditável “Dio Come Ti Amo”, que fez sucesso no Brasil com a sussurrante e sedutora Gigliola Cinquetti.

A abertura de Ná Ozzetti para a desconstrução, com muito refinamento, diga-se de passagem, de composições clássicas é uma de suas marcas registradas. Para acentuar seu bom gosto e ousadia, ela sempre se cercou de músicos experientes e talentosos. Este lado desrespeitoso, no bom sentido, está presente em Balangandãs(2009), seu último trabalho, que homenageia Carmem Miranda no ano em que a portuguesa mais brasileira de todos os tempos completaria 100 anos.

Em Balangandãs, Ná chamou amigos e bambas, com quem já trabalhara em outras ocasiões, como o irmão Dante Ozzetti (violão) e o excepcional Mário Manga (guitarra, violoncelo e violão tenor), que dão o colorido e a classe que o projeto exigia. Não daria para esperar nada diferente desse bando virado pra lua. A velha Carmem ganhou aqui uma roupagem provocativa e muitas vezes pouco fiel ao estilo que a tornou conhecida no mundo inteiro, graças aos arranjos elaborados e inteligentes que orientam o CD.

Como exemplo do diferencial do projeto proposto por está “Disseram que eu voltei Americanizada”, que começa à capela para a entrada em seguida da guitarra distorcida e roqueira para cair num samba cadente, desacelerando o ritmo, no caminho inverso feito no original de Carmem Miranda. Reparem na desconcertante mudança de andamento da música.

Nessa linha estão ainda, entre outras, a pouco conhecida “Ao Voltar do Samba”, com a guitarra meio amaxixada e cuja introdução lembra o carimbó. Deliciosa e animada. E “Na Batucada da Vida”, de Ary Barroso, com arranjo elegantíssimo, com destaque para o contrabaixo de Zé Alexandre Carvalho em solo com a bateria em levada ora jaz ora afoxé de Sérgio Reze. , com sua voz inconfundível, conseguiu dar novas cores à batida composição já gravada por boa parte dos medalhões da MPB.

Mas tem um outro lado, mais reverente, que revela a influência que Carmem Miranda teve na vida de . São os casos de “Touradas de Madri”, “Diz que tem” e “A Preta do Acarajé” que usam a estrutura antiga dos sambas cantados pela pequena notável, com backing vocal masculino grave e com a paulista arrebentando na utilização de timbre e vocalises que a aproximam do mito. Tudo isso, é claro, com um toque de modernidade que sempre esteve presente na carreira da cantora que começou a carreira no estiloso grupo Rumo. Balangandãs honra, com sobras, a inesquecível Carmem. Discaço.

Cotação: 5

Vá de batucada moderna:


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Assista "Adeus Batucada" com Ná:


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Jogo empatado

As cordas de aço do violão em primeiro plano acompanhada da voz corpulenta e aveludada de Fin Greenall dão o tom do que o ouvinte vai ouvir a partir dali. A beleza soul e envolvente de “Sort of Revolution” que abre espetacularmente o disco de mesmo nome do britânico mais conhecido como Fink anima os neurônios. Aí vem a deliciosa “Move on Me”, com a participação na autoria e no piano do aclamado John Legend, com um arranjo classudo, e você fica de quatro com a espantosa melodia e a entrega emocionada do intérprete.

O acento soul e a indefectível classe da música de Fink, em seu terceiro registro fonográfico (os outros dois são Biscuits for Breakfast(2006) e Distance and Time(2007) permanecem impactantes nas músicas seguintes, a também bela “Six Months”, com seu violão minimalista, e a folk “Nothing is ever Finished”. Mas daqui por diante, ou seja, da metade até o final do CD lançado este ano, fica o desconforto de uma música que se perde na toada da repetição.

A levada soul, com um maneirismo às vezes funky, tenta manter o disco aceso, como na interessante “See it All”, que lembra as criações mais pops do gênio Thom Yorke, mas, em outros momentos, cai na modorra. São os casos da longa e chata “Q & A”, com uma irritante vozinha de background, e “Maker”, com uma programação eletrônica dispensável e melodia pouco inspirada. Fink também não é feliz na sua versão gospel do clássico “Walking in the Sun”, de Jeff Barry, que leva nota baixa no quesito reinvenção.

Entre mortos e feridos, fica a impressão de que Fink precisa acertar a pontaria. Fica também ecoando em nossos ouvidos a limpeza e elegância de arranjos – um dos pontos altos do trabalho – que poderiam ter rendido um álbum antológico. Mas, as bolas na trave deixaram esse jogo empatado. Ainda assim, um disco para se ter.

Cotação: 4

Ouça com carinho este “Sort of Revolution”:

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terça-feira, 19 de maio de 2009

Meio Chico meio Carvalho

O diretor Walter Carvalho sabia que tinha um trabalho hercúleo pela frente quando resolveu filmar Budapeste, de Chico Buarque. Afinal, o livro sobre um escritor em crise existencial com a profissão e relacionamentos amorosos, com sua narrativa entrecortada, não facilitava uma tradução para as telas. Em Budapeste, o filme, que estreia nesta sexta-feira, 22 de maio, nos cinemas, o cineasta respeita Chico, mas amplia o lastro subjetivo da obra literária buscando uma co-assinatura para a história.

O filme mergulha junto com o narrador, o ghost-writer José Costa, nas amplas possibilidades de reinvenção que o amor, o verbo e uma língua propiciam. O personagem empresta seu talento descomunal às pessoas que tentam a fama ou querem contar suas histórias em um livro. Ele próprio tem medo de expôr sua criatividade. Essa crise é bem resolvida no filme de Carvalho, que valoriza nas imagens o poder da palavra escrita, que domina e escraviza Costa, vivido magistralmente por Leonardo Medeiros.

O espectador não deve buscar no longa-metragem a similitude com o livro. Até porque a subjetividade deste não permite. A linha básica do romance é respeitada. Maior do que seus personagens, porém, é exatamente essa relação dual de Costa com a língua e de que forma ela molda comportamentos, cultura e alimenta paixões. É o verbo, mesmo em outra língua, a húngara, que faz o personagem se encontrar. E é essa vida desfeita e refeita pela palavra que vale a pena acompanhar no filme de Carvalho, na foto acima com o presidente Lula.

Budapeste não é um grande filme, assim como o livro de Chico também não é lá essas coisas. A narrativa monolítica cansa um pouco, mas há iluminuras que compensam, como a linda fotografia amarelecida da Budapest, a presença de Chico Buarque numa ponta bem humorada e as interpretações, a já citada de Medeiros, e da atriz húngara Gabriella Hámori. O resto é viagem. Você só precisa estar disposto a embarcar nela.

domingo, 17 de maio de 2009

Feijoada explosiva

Lembra Raimundos, da boa fase, e também Chico Science e um pouco os alucinados Móveis Coloniais de Acajú. Lembra, na verdade, aqueles grupos que, sem vergonha, liquefazem as influências hardcore num emaranhado musical que, ainda assim, trazem um carimbo próprio. Gilbertos Come Bacon vem de Planaltina, usando uma velha fórmula, para mexer, em seu disco de estréia, com o amuado rock candango.

Primeiro lançamento do ano da gravadora brasiliense, GRV Discos, Gilbertos Come Bacon(2009) veio ao mundo porque a banda homônima ganhou o I Festival Universitário de Música de Brasília. Foi o prêmio. Para o grupo e para os fãs de um rock mais veloz e, aqui, ponto pra lá de positivo, com tutano. Os sete meninos e a menina, uma baixista, da banda fazem um som urgente, com letras que investem no discurso social com o verbo solto, que beira em certo momento e sem pudor a escatologia.

Esse desapego ao hardcore tradicional é francamente assumido pelo grupo. Eles batizam sua música de “rabicóre”, que pode ser visto como uma mistura orgânica de guitarras pesadas e aceleradas com uma instrumentação sem amarras que têm a percussão e a levada rap – no diálogo dos vocalistas Eduardo e João – como elementos mais marcantes. Por isso é som para quem não está em dieta, com muito tempero. Uma feijoada explosiva.

No mar de influências em que a banda mergulha, é possível ouvir um Raimundos com neurônios na bacana “Minha Casa”, cuja letra faz uma comparação quase concretista do corpo humano com a casa. O mix radical de Chico Science e Nação Zumbi é visível em “Sorriso de Plástico”, com sua percussão esperta bem casada com o rap. O skacore que municia o Móveis se faz presente na ganchuda “Piolho”, que tem participação especial e bem humorada do imprevisível Tom Zé.

Gilbertos Come Bacon não tem a pretensão de inovar. A banda faz o que os grupos citados anteriormente exercitaram, mas com uma liberdade que leva a intervenções sonoras diferenciadas e produz um som que não soa como cópia. Mérito também das letras politizadas que escapam do panfletarismo, como em “Adulteraram”, que fala do mau uso do poder ou na bem sacada "Gilbertos", sobre um cara que para ser “considerado” tenta parecer com um gringo. Um boa estréia de uma banda que merece ser acompanhada com interesse.

Cotação: 3

Fico devendo o link para o disco, mas como aperitivo lambuze-se com esse torresminho:

http://www.myspace.com/gilbertoscomebacon

Ou para mais informação, vá em:

www.grv.art.br

Rock demolidor

Esse tal de rock and roll tem umas crias que enchem a gente de alegria. Desde que saiu do Pulp, banda que se tornou um dos ícones do britpop ao lado de Oasis e Blur, Jarvis Cocker vinha engrenando um pacto efetivo com a história. E fazer história nesse terreno musical com tantos pretendentes a ídolos e gênios, não é lá, convenhamos, muito fácil. E Jarvis se destaca no meio desse grosso caldo roqueiro com um dos discos mais instigantes e demolidores que ouvi este ano.

Further Complications(2009) vai um pouco na contramão do bom Jarvis(2006), o primeiro solo do artista britânico. É mais sujo e pesado, uma provável contribuição do produtor Steve Albini, de alma punk, que já colocou o dedo em álbuns do Nirvana e Pixies, só para citar dois gigantes. É mais coeso do que seu antecessor também, o que mostra uma bem vinda linha ascendente desse músico inquieto, que se distancia consistentemente da banda que o projetou.

O que mais agrada em Further Complications são os riffs e refrões pegadores, distribuídos generosamente por todo o CD, que tem no rock básico e direto a sua maior virtude. É isso mesmo, viúvos e viúvas do Pulp. É possível ver ecos a la Kinks em músicas como “Ângela” e de surf music, presentes na instrumental "Pilchard", onde a voz de Jarvis é apenas onomatopaica, e na balouçante “Homewecker”.

O vigor do rock, no que ele tem de mais direto, está ainda na música que deu nome ao CD, com baixo, guitarra e baterias matadores ancorando a voz mais encorpada(mais do que o normal, diga-se de passagem), do artista. E em “Caucasian Blues”, que de blues não tem nada. Rockões desbragados e com riffs arrepiantes, desses que ficam rodando ébrios em nossa cabeça por um tempo.

Mas, se você quiser um Jarvis mais calminho, escute com prazer as lindas “Leftlovers”, com uma levada que mistura a sonoridade gutural de Leonard Cohen e Lou Reed, e, principalmente, "I Never Said I Was Deep", cool e arrebatadora. Taí um discaço. Bom pra viagem, pra despertar da pasmaceira e até pra dançar coladinho. Dez de luxo.

Cotação: 5

Linke-se quem puder:

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ou:

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quinta-feira, 14 de maio de 2009

Moderno e bem resolvido

Muito se fala da avalanche de boas cantoras e compositoras surgidas no Brasil nos últimos anos. Mas, a ala masculina da MPB também está na área mostrando seu valor, ainda que de forma meio tímida. Um dos maiores celeiros dessa nova e talentosa geração é São Paulo. É de lá que vem Rômulo Froes, de quem resenhei o ótimo No Chão sem o Chão, e seu companheiro de baladas Bruno Morais, que lançou o também notável A Vontade Superstar(2009), seu segundo trabalho.

Assim como Froes, Bruno Morais integra o grupo de modernos músicos paulistas que tem um pé no passado e o outro no futuro. Um voluntarioso equilibrista que quer ganhar o público médio, mas sem perder de vista a ousadia e o exercício de uma assinatura própria. Apropriando-se de metais vibrantes e coros despretensiosos de amigos em boa parte das músicas, o paulistano constrói em A Vontade Superstar um repertório que surpreende pela unidade e segurança.

Urbano até a tampa, Morais faz, com sua voz pequena, um discurso cosmopolita onde fala de amores perdidos, solidão e relacionamentos conflitantes. Casos de “ Do Inferno”, na qual um baixo marcante e pontual acompanha a letra direta que fala de pessoas que infernizam nossas vidas, ou da jazzística “Pode Morrer”, sobre uma separação premente descrita com poética objetiva, como faziam os velhos mestres da MPB: “Se você me der adeus, não pense mais em mim que eu ficarei com Deus”.

Como todo bom moderno, Morais não nega influências musicais, mas consegue dar a elas um sabor e frescor típicos daqueles que pensam a música com inteligência. Caso da bacanérrima “O Mundo é Assim”, onde um violão dedilhado compartilha o arranjo esperto com uma monocórdica bateria acendendo o interesse pela melodia. Ou da mais difícil “Bombeiro Vermelho”, onde os metais se contrapõem ao vocal, com sonoridade elaborada que resvala no reggae.

A dualidade entre o pop e a experimentação estão presentes na atonal música “Aparelho Sensível” e também na animadinha “Continuar”, que lembra o alagoano Wado com sua guitarra funkeada ou no trip hop que fecha o disco, com belas letra e música. O despojamento pop, se é que podemos chamar assim, pode ser visto aqui e ali, meio que embrionário, na sucinta “O Mito dos Corações Partidos” e seu corinho primaveril e no ótimo sambinha triste “Hoje eu vou te Acordar”.

A Vontade Superstar é um disco com vontade de ser marcante, uma clara evolução do que foi apenas pincelado no bom Volume Zero (2005), primeiro álbum do artista. E Morais chegou lá, com promessa de ir ainda mais longe.

Cotação: 4

Link solitário para ouvir o disco:

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segunda-feira, 11 de maio de 2009

Entre o céu e o inferno

Quando estreiou no Brasil, X-Men Origens: Wolverine dividiu opiniões. O longa-metragem dirigido por Gavin Hood (vencedor do Oscar por Infância Roubada) chegou cheio de marra às salas de cinema. E não era por menos, afinal, a pretensão do filme era conquistar corações e mentes com esse personagem deliciosamente irascível e amoral da trupe bacaninha dos homens “X”. Acabou ficando no meio do caminho nesta empreitada.

O longa-metragem de aventura é o que popularmente pode se chamar de um produto “meia boca”. Um dos grandes problemas do filme é carregar nas cores dramáticas em uma história que já tem, como agravante, um roteiro capenga. O cinismo de Wolverine (Hugh Jackman) vai perdendo a força já no moralismo das primeiras cenas, quando ele e o irmão Victor (Liev Schreiber), se desentendem pelo herói não aceitar os métodos virulentos do tresloucado parente de sangue.

Até aí tudo bem. Até porque o Loguinha “paz e amor” acaba perdendo, lá na frente, as estribeiras quando vê a amada, a bela Raposa Prateada(Lynn Collins), assassinada. E sua vingança, cheia de culpa, é o fio condutor dessa história. Mas, o confronto ético interno que o personagem desenvolve é tão débil quanto a intenção do filme de gerar empatia com o relacionamento de Logan e sua esposa.

Tudo bem que o Wolverine ácido só surge mais claramente – na história em quadrinhos – depois que o herói perde a memória. Mas que esse lado mais cínico faz falta no filme, faz sim. Até o próprio Jackman, pela terceira vez na pele de Logan, parece diminuído nessa sua cruzada moral.

A frustrada história de amor é explicitamente mal engendrada no roteiro, que tem a assinatura da dupla David Benioff e Skip Woods. Meia boca também é a inclusão de um bando de mutantes, muitos deles futuros X-Men, como um jovem Scott, que surgem do nada para fazerem absolutamente nada no longa de ficção. A valorização da vingança de Logan, e sua fúria animal, por sua vez, parece cair no vazio quando ele dá de cara com a dura verdade.

Se deixasse o drama de lado e se concentrasse na ação propriamente dita, talvez Wolverine fosse um filme mais excitante. Entretenimento é a proposta central dos quadrinhos mais comerciais, de onde, afinal, saiu o personagem. E ainda se concentrasse nos músculos do herói, o diretor ainda teria que ter cuidado com a previsibilidade das cenas e o excesso de efeitos especiais, esses sim – sempre eles – os grandes salvadores da produção hollywoodiana. Pena que isso seja muito pouco para uma obra que gerou tanta expectativa.

Faça o download aqui do trailer do filme ou assista clicando no link da barra de vídeos ao lado:

http://www.vuze.com/downloadapp/GQ3YAYZCQGION4BT2V46SJRU6RRIDAHE

domingo, 10 de maio de 2009

Pra que tanta festa?

Desconfio quando um álbum é incensado por todos, ainda que, deva alertar, não considero todas as unanimidades uma burrice, como bombardeou um dia o aloprado Nélson Rodrigues. Só desconfio e pronto. Por isso, ouvi com um pé atrás It’s a Blitz (2009), último da banda novaiorquina Yeah Yeah Yeahs. É o terceiro desse power trio, que resolveu trocar o rock por uma sonoridade mais dance e eletro. Cada um faz do seu som o que bem entende, e tentativas de mudanças são sempre elogiáveis, mas, nesse caso, pra mim, a novidade não desceu lá muito redonda.

“Um dos melhores lançamentos do ano”, como foi classificado em boa parte das críticas, sofre, a meu ver, de uma certa anemia e assepsia. Vá lá que a turma da ótima vocalista Karen O, mais afinada e potente que nunca, inspirou-se na dance music dos anos 70, mas a tecladeira presente em “Zero”, “Heads Will Roll” e “Soft Shock”, que abrem o disco, podem até ajudar a animar uma pista, mas soam como algo já ouvido antes e sem energia inovadora, ainda que essas músicas sejam executadas com eficiência.

Ou seja, faço parte daqueles fãs mais radicais da banda que preferiam a atitude e sonoridade mais sujas presentes nos álbum anteriores, principalmente no ótimo debut Fever to Tell (2003). Nada com a seqüência alentadora das explosivas "Tick", "Black Tongue" e "Pin". Talvez pensando nessas pessoas ranzinzas, é que o Yeah, Yeah Yeahs dá uma canja aos fãs de primeira hora e aumente o volume das guitarras nas precisas “Dull Life”, a melhor do álbum, que chega a lembrar os momentos mais inspirados da excelente Artic Monkeys, e “Shame and Fortune”, com sua batera e cordas dando o tom hipnótico da composição. Destaque ainda para a inesperada mas convincente balada "Runnaway".

Enfim, tenho saudade do trio quando usava o pedal da guitarra e o nervosismo rocker que conquistaram uma porrada de adeptos. E ainda que seja engraçado ser nostálgico com relação a uma banda que ainda está nos cueiros, alimento a esperança que o trio retorne às suas origens mais radicais para saciar essa nossa insaciável fome de adrenalina musical.

Cotação: 3

Cheque a mudança e tente um desses
:

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quarta-feira, 6 de maio de 2009

Ressaca dos bons tempos

Grandaddy está de volta, ou melhor, Jason Litle, o líder da banda indie que fez a alegria de muita gente de 1997, quando o grupo lançou Under the Western Freeway, até 2006, ano do adeus com o álbum Just Like The Fambly Cat. Litle volta a cena com seu primeiro álbum solo, o mediano Yours Truly, The Commuter(2009), produzido num esquema caseiro, no próprio estúdio do artista.

Yours Truly, The Commuter é uma espécie de continuação da música climática produzida pela banda que tornou Litle conhecido. A canção que batiza o álbum, “Brand New Sun” e “Ghost of My Old Dog” é Grandaddy puro. Aqui é possível ver aquele misto de folk music, teclado climático, vozes duplicadas e barulhinhos eletrônicos que deram uma identidade ao grupo. Caberiam tranquilamente em qualquer um dos discos de carreira dos músicos californianos.

A partir da quarta música, a bela e lentíssima “I Am Lost (And The Moment Cannot Last)”, a história muda um pouco de figura. Jason Litle traz de volta o som etéreo da antiga banda, só que numa levada ainda mais low-fi e preguiçosa. São mantidas as texturas eletrônicas e orquestrais, com muito piano, cordas e clima viajandões que lembram Radiohead, com quem aliás o Grandaddy foi comparado maldosamente no início de carreira.

Nessa linha emocional, o ouvinte tem a modorrenta “Fürget It”, onde um sussurrante Litle é acompanhado por coro angelical, e a intimista e envolvente “This Song Is The Mute Button”. Essas duas, aliás, dão o tom, do restante do CD, quebrado apenas pela mais animada “It's The Weekend”, com guitarras mais pesadas e refrão grudento.

É esse clima crepuscular que cansa em Yours Truly, The Commuter. É como se Jason Litle ainda estivesse vivendo a ressaca do fim do Grandaddy. Uma parcela dos velhos fãs vão até gostar da onda nostálgica proposta. O cara, contudo, já foi mais inspirado. Que o diga a obra prima do grupo, The Sophtware Slump(2000). Falta-lhe apenas o exercício para que as luminosas melodias de antigamente retornem. A gente espera.

Cotação: 3

Passe a régua:

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sábado, 2 de maio de 2009

Passo seguro à frente

A paulistana Mariana Aydar vive o teste de seu segundo disco. Depois de uma elogiada estréia com o bem legal Kavita 1(2006), a bela artista lança Peixes, Passaros Pessoas(2009). E dá um passo seguro no caminho de se fixar como uma das mais interessantes cantoras da nova geração da MPB. Até porque não se acovardou: saiu de um álbum de intérprete, recheado de clássicos do nosso cancioneiro, para um trabalho mais autoral, onde arrisca composições suas e de contemporâneos, como o artista plástico Nuno Ramos e o namorado Duani, também produtor do disco ao lado do incensado Kassim.

Na verdade, o passo a frente de Mariana é comedido. Seus riscos são calculados, mas sinceros. Peixes, Pássaros Pessoas se rende em boa parte ao samba. Aqui, mantem o sabor pop do disco anterior, mas, ao contrário daquele, experimenta composições novas e desconhecidas, sambinhas assinados quase todos por Duani, integrante do grupo Forroçacana. E acerta, na maioria das vezes, no repertório. Casos da doce e potente “Florindo”, que abre o CD em grande estilo e da bem humorada “Aqui em Casa”, de autoria de Kavita, pseudônimo que ela usa para assinar suas próprias músicas.

O samba ecoa forte no disco e ela assume isso na autobiográfica “O Samba me Persegue”, com participação especial de Zeca Pagodinho. Nessa, Aydar canta: “Se eu fosse a rainha do Rádio, colocava o danado em primeiro lugar/ O samba me persegue e eu não vou negar”. Mesmo animado, este samba não é dos mais representativos do disco. Melhor mesmo é ficar com “Teu Amor é Falso”, samba de letra bem resolvida e estrutura clássica e “Poderoso Rei”, onde fica evidente a influência de Clara Nunes em sua vida, o que já havia demonstrado em Kavita 1, regravando sucessos da saudosa artista.

Mas, não é apenas a correção dos sambas que anima, ainda que os arranjos destes deixem um pouco a desejar. Uma outra Mariana pode ser sentida em composições que fogem daquele gênero. Mais ousada, ela busca, na parceria de Nuno Ramos, artista plástico talentoso e também compositor, navegar em outros mares. A sinuosa “Tudo o que eu Trago no Bolso”, quase cantada à capela, onde ela está acompanhada de uma guitarra jazzística e atonal, e o baião “Tá”, com sopros e teclado fazendo o contraponto à estrutura mântrica daquele gênero musical, são caros exemplos de que essa paulistana vai longe. Avoé, Mariana, você passou com graça e firmeza pelo teste do segundo disco.

Cotação: 4

Vá de Mariana, seguindo a trilha das três opções abaixo:

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quinta-feira, 30 de abril de 2009

De cara pro sol

Alguns artistas têm ojeriza à mídia. Vivem em reclusão concebendo suas viagens pessoais e, por contraditório que pareça, fazendo exatamente fama com isso. É o caso do caipira Bonnie “Prince” Billy, um dos ícones do alt-country, gênero musical que nada é mais do que um sertanejo norte-americano mais estetizante. O barbudo acaba de lançar Beware(2009), o 14º disco de sua carreira.

O novo de Will Oldham, verdadeiro nome do cantor e compositor, deixou muita gente surpresa. Isso porque, o cara vinha ruminando uma série de trabalhos banhados em melaconlia, com letras engenhosas e linha melódica soturna. Em Beware, o norte-americano arrisca aumentar a voltagem de suas canções. E se cerca de instrumentação consistente e músicos talentosos para fazer um trabalho mais acessível.

Tem mais cor e alegria em músicas como “Beware Your Only Friend”, “You Can´t Hurt me Now” e, principalmente, em “You Don´t Love Me”, essa encorpada por saxofone e guitarras em meio a um arranjo tradicional e quase pop. Há ,mais claramente, formalismo e apelo à tradição, características inesperadas em se tratando de Bonnie Prince, em composições como “I Don’t Ask Again”, com sua slide-guitar melosa e corinho estupefaciente, e na deja-vu “I Don´t Belong to Anyone”.

Mesmo na praia do convencional, o caipira manda bem. Não é, porém, o que ele faz de melhor, até porque nessa linha existem muitos outros craques. Mas, para o gozo dos velhos fãs que idolatram a obra-prima I See a Darkness- Bonnie 'Prince' Billy(1999) e toda sua tristeza infinita, o compositor oferece pepitas de sua melhor lavra. É o caso da linda “Death Final” e da dolorida “There is Something I Have to Say”, essa sim de uma beleza poética e melódica irretocável, arredondada por um baixo que dialoga encantadoramente com a voz correta do artista. É o que salva esse trabalho apenas mediano, mas que vale ser ouvido com atenção.

Cotação: 3

Experimente com control C control V:

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segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ela dança, eu danço

Peaches (batizada Merril Nisker)ganhou o mundinho underground com sua atitude despachada, à base de muitos palavrões e sexualidade exacerbada. A canadense e uma das musas do electro-clash, uma mistura apimentada de eletrônica, hedonismo e rock descerebrado, volta, três anos depois de seu último CD, Impeach My Bush(2006) às prateleiras das lojas com seu terceiro trabalho I Feel Cream(2009).

O novo da desabusada não está assim tão desabusado. Mas, nem por isso, menos excitante. Peaches gravou um álbum de rachar pistas de dança. I Feel Cream é um petardo que bebe na eletrônica, rock e hip hop com igual desenvoltura e energia. Para essa jam session energética, Peaches convocou alguns dos nomes mais celebrados da cena eletrônica atual: Simiam Móbile, Digitalism, Soulwax e Drums of Death, que assinam, ao lado dela, a produção.

O resultado não poderia ser mais instigante. Depois de um começo um tanto morno, a monótona "Serpentine", o álbum cresce explosivo com as ótimas “Talk to Me”, a primeira música de trabalho, com uma irresistível fusão com o rock, e a dance “Lose You”, que, me perdoem os fãs da cantora, lembra uma Madonna mais endiabrada. Difícil ficar parado. E o disco segue pulsante com a hipnótica “More”, com batidão forte e muitos efeitos, e a eletro-hip-hop “Billionaire”.

Homogêneo, I Feel Cream é uma mostra inequívoca do talento de Peaches, com sua bela afinação. Torna-se aqui potencialmente uma séria candidata à rainha na praia do electro-clash, depois de uma tentativa frustrada de descambar para uma linha mais roqueira. E a danada pode. Para tirar qualquer dúvida, refestele-se com a contagiante “Show Stopper” ou a impagável “Mommy Complex”, duas das mais incendiárias composições desse libelo dançante.

Cotação: 4

Rode a baiana:

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quinta-feira, 23 de abril de 2009

Caudalosa ousadia

Não é muito fácil escutar Rômulo Froés. É preciso ter ouvidos educados. E persistir para ter o claro entendimento do caleidoscópio musical proposto pelo artista em seu terceiro trabalho, No Chão sem o Chão(2009). Froés tenta escapar da pecha de sambista que o vinha perseguindo até agora e comete um dos discos brasileiros mais autorais e ousados, se não o mais, desse ano.

Eloquente, o paulistano resolveu lançar um álbum duplo, dividido em duas sessões, a primeira “Cala Boca já Morreu” e a segunda “Saiba ficar Quieto”. Nas duas, o músico, ao lado dos letristas e artistas plásticos Nuno Ramos e Clima, dá uma guinada em sua carreira fazendo transambas e transrocks, expressões criadas por Caetano Veloso para designar a mistura de samba e rock com tempero essencialmente brasileiro.

No Chão sem o Chão é um exercício musical complexo, sem que pra isso caia necessariamente na chatice. Froés continua a fazer seus sambinhas tortos, agora com guitarras dissonantes e com a mesma tristeza sem fim, já presentes em seus dois álbuns anteriores, Calado(2004) e Cão(2006). Casos das bacanas “Qualquer Coisa em você Mulher”, “Só Você faz Falta”, uma concessão adorável ao pop, da marchinha carnavalesca “Ela me quer Bem” e da sinuosa “Caia na Risada”, uma das melhores do projeto.

Mas, Fróes quer avançar e é com a ajuda da energia rocker, no que o gênero tem de alternativo, que consegue a chave da transformação. E aqui o músico bebe de influências diversas. É possível ver ecos do tropicalismo, com suas guitarras rasgadas, em “Destroço” ou em “Caveira” e visualizar ainda uma paisagem indie rock na inclassificável “Anjo”, que começa pesada para depois afagar esperta nossos neurônios.

Em parte das canções, graças a banda mais roqueira de Fróes, os solos de guitarras surgem largados, livres em improvisações muitas vezes desconcertantes a cargo de Guilherme Held e do mito Lanny Gordin, em participação especial. Ouça “Do Ponto do cão” e “Deserto Vermelho”, entre outras, e ateste.

Mas, as referências sonoras não se resumem à pegada rock. Até porque o artista quer se livrar de rótulos. E nesse sentido, ele é generoso. Há toques de ska em “Minha Casa”e há atonalismo, que lembram o Arrigo Barnabé de início de carreira, em “Peraí”. E tem canções com alma emepebística sem que esbarrem nas convenções como na ótima “Para Fazer Sucesso” ou mergulhando na tradição como a linda “Saiba Ficar Quieto”. Qualquer que seja o ritmo, é possível sentir uma arquitetura homogênea nas letras refinadas, ora concretistas ora surrealistas, mas sempre desconcertantes e intrincadas.

Por tudo isso, ouvir Rômulo Froés em seu surto criativo e abundância de propostas musicais é reconfortante. Há vida inteligente em nossa música. No Chão sem Chão é uma prova cabal disso.

Cotação: 5

Beba da fonte, copiando e colando:

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terça-feira, 14 de abril de 2009

Garota, eu vou pra Califórnia

Direto da seção bandas insurgentes candidatas a queridinhas da vez, o Todoouvido foi parar na Califórnia, nas asas de blogs antenados. Dois grupos bem barulhentos daquela ensolarada região têm chamado atenção dos blogueiros de plantão. E com elogios unânimes. Trata-se do Wavves e Crystal Antlers, que estão lançando seus primeiros trabalhos de peso em abril desse ano com estardalhaço no underground.

Das duas, Crystal Antlers, e seu Tentacles(2009), é a mais interessante. Na linha revivalista, esses moleques californianos mergulham na psicodelia com direito a teclados e guitarras alucinados, como na abertura instrumental “Painless Sleep”. A paulada come solta na ótima “Dust”, uma descarga de duzentos volts, com bateria e voz rápidas, bem ao estilo do progressivo setentista.

Destaque para o vocal rouco de Johnny Bell. O cantor trabalha no limite da tensão, que a música urgente da banda pede, sem perder o prumo e o foco. É possível ser afinado apesar de toda gritaria? Bell prova que sim. Ouça “Time Erased” e “Memorized”, essa com teclado soporífero que lembra The Doors, e cheque o inegável talento do cara. O vocalista é acompanhado por Andrew King(guitarra), Kevin Stuart(bateria), Victor Rodriguez(órgão), Damian Edwards(percussão) e Errol Davis(guitarra).

No meio da pauleira, vide a histérica “Tentacles”, e algumas viagens boba, com a tecladeira lisérgica dialogando com guitarras distorcidas, na música “Vapor Trail”, há espaço para baladões contundentes no CD. São os casos das boas “Andrew”, um blues de responsa, e a linda “Until the Sun Dies(Parte One)”, que lembra Pearl Jam, na entrega e vigor da banda e do vocalista, reforçada pela louca mudança de andamento.

Tentacles, do Crystal Antlers, que antes só havia lançado um elogiado EP, em 2008, é realmente uma grata surpresa. Olho nessa galera.

Cotação: 4

Psicodelize-se:

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Rock tinhoso

Wavves, assim mesmo, com dois “v”, é mais pop, menos técnico, mas tão elétrico quanto seus conterrâneos. Nathan Daniel Williams, o tinhoso moleque por detrás da banda, vêm de um primeiro trabalho, homônimo, lançado há apenas quatro meses. Wavvves (2009), esse é o nome do álbum, passeia entre o rock garageiro e o indie e também pela instabilidade. Sem muito compromisso formal, o CD arrisca até experimentações sonoras, como na instrumental “Rainbow Everywhere”, um space rock dispensável.

A partir da segunda faixa, Williams mostra a que veio. E acende as luzes das pistas para quem quiser dançar com a tosqueira de composições repletas de coros sem-vergonhas e levada de garagem. Os três acordes e a bateria acelerada de “Beach Demon” são contagiantes. Na mesma pisada, “To the Dregs” acelera, com direito a corinho pontuando a melodia direta e veloz, de apenas 1:58. Ganham o ouvinte na mesma velocidade.

Quando desacelera e se aproxima de um indie rock cabeça, como na faixa “Sun Open my Eyes”, monocromática e tediosa, na instrumental “Goth Girls”, com barulhinhos eletrônicos aleatórios e irritantes, e, principalmente na parte final do CD, o Wavves perde o rumo. Melhor mesmo é ficar com as composições bubblegums de estrutura simples, como as legais “No Hope Kids” e “Califórnia Goths”. Aqui, o infernal Nathan Williams mostra que tem potencial para conquistar platéias. Só precisa focar sua música. A maturidade, com certeza, vai lhe dar régua e compasso.

Cotação: 3

Arrisque:

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domingo, 12 de abril de 2009

Virada pra lua

Quando voltava do Centro Cultural do Banco do Brasil, aqui em Brasília, dirigindo na via que dava no prédio, um estrangeiro pediu informação, com um sotaque carregado, sobre onde ficava o CCBB. Estava com uma cara feliz, brilho nos olhos, como uma criança à beira de se refestelar na Disneilândia. O motivo da alegria me parecia óbvio, ainda que o estranho não tivesse explicitado: ele estava indo ver a exposição Virada Russa.

Imagino que é assim que reagem os povos das nações milenares mais acostumadas com a riqueza e a beleza das artes plásticas. A oportunidade de ver Kandinski, Chagall, Maliévich e Rodtchenko, entre outros gigantes da vanguarda russa causa mesmo esse frêmito nos europeus. É a alegria de estar diante de uma arte suprema, única, que influenciou e ainda influencia artistas de todo o mundo. Nós deste país criança, pelo menos a maioria, não temos esse impulso. Somos ainda ignorantes e incautos.

Por isso ir ao CCBB para ver os russos deve ter a aura de um ritual. As 123 obras do Museu de São Petersburgo, uma coleção exuberante, é pra ser vista de joelhos. E mais de uma vez. Afinal, essa é uma chance raríssima de ver craques da arte mundial, como Chagall, que participa com a linda e conhecida tela Passeio (veja ao lado), com todas as característica que marcaram seu trabalho: leveza, cor e onirismo.

Na exposição Virada Russa, o visitante pode dar de cara também com o colorido impactante e multifacetado das obras de Kandinsky(foto ao lado), outro mestre do moderno, e de Kazimir Maliévich. Esse ganhou uma sala própria. O único. E não poderia ser diferente. Ele foi um dos maiores, se não o maior, incentivador de uma vanguarda – no plena acepção dessa palavra – que polemizou a Rússia e ainda guarda uma vitalidade impressionante.

De Maliévich, três das pérolas expostas são ícones do modernismo que, pessoalmente, não me agradam muito: a cruz, o quadrado(foto) e o círculo, figuras geométricas pintadas em preto sobre fundo branco. Refletem a complexidade de um artista em busca da forma simples e absoluta, mas com extremo rigor formal, e que acabou gerando a escola Suprematista, criada por Maliévich e da qual se tornou seu maior representante.

Ninguém pode negar a surpreendente coragem dos russos de perseguirem uma nova forma de arte. E é essa a grande percepção da Virada Russa, no CCBB. Ver um bando de artistas nas duas primeiras décadas do século passado, à beira da revolução soviética, desafiando a tradição com uma linguagem pictórica extremamente moderna. E você pensa como essa galera chegou a esse nível de experimentação tão fantástica num mundo, principalmente o russo da época, tão preso ainda ao passado.

Tão bacana quanto vislumbrar o futuro num passado distante, quase cem anos atrás, é ter a oportunidade de conhecer artistas fabulosos dos quais você nunca ouviu falar. Caso de Natalia Gontcharova (obra ao lado)e Pavel Filónov, a primeira, representante do raionismo, escola feita de abstração e pinceladas curtas e nervosas. O segundo foi seguidor supertalentoso do construtivismo. Desse, a tela Guerra com a Alemanha (foto abaixo), com todo seu detalhismo, simbologia e criatividade, é de tirar o fôlego.

Virada Russa é dessas raras exposições que ficam na memória. Uma aula de vigor e sensibilidade que educa e ajuda o visitante a entender um período da história de renascimento cultural invejável. Arrefeça sua ignorância e vá com urgência.

Cotação: 5

sábado, 11 de abril de 2009

Reino da maturidade

Eles demoraram quatro anos, depois de Some Cities (2005), para gravar um disco. Mas, os irmãos Jez e Andy Williams, ao lado do amigo de infância, o vocalista e baixista Jimi Goodwin, sacudiram a poeira e azeitaram seu pop rock melódico. Doves, o trio de Manchester lançou no início de abril deste ano, o consistente Kingdom of Rust(2009), um trabalho de maturidade que supera em muito o álbum anterior. É um dos primeiros grandes álbuns do ano de uma banda já estabelecida.

Difícil não se animar com as músicas que abrem o disco. É uma porrada bem dada. "Jetstream", a de abertura, é acida e pomposa. A trilha para fechar os créditos finais do filme Blade Runner, de Ridley Scott, segundo a banda. Bobagem. É música para a trilha sonora de quem curte um rock bem feito e produzido. É também uma investida da Doves na praia da eletrônica e seus climas etéreos. Um toque dado provavelmente pelo produtor Dan Austin, do Massive Attack, um dos pais do trip hop.

Esses toques eletrônicos podem ser vistos ainda de leve na melhor música do disco, "Kingdom of Rust" dona de belos melodia e arranjos de cordas e cantada com paixão por Jimi. Essa já nasce clássica. A composição rivaliza um pouco com "Spellbound", com uma levada meio radioheadiana, dos tempos de Pablo Honey e Bends, e "10:03", uma balada doída. Climáticas e envolventes. É bom lembrar ainda que o outro produtor de Kingdon of Rust é John Leckie, engenheiro do segundo disco do Radiohead.

Os dois produtores citados dão suas boas contribuições, mas não tiram o mérito autoral dessa banda inglesa, que sabe criar belas melodias e grandes refrões. E se o negócio é rock and roll para balançar, Doves também não nega fogo e mostra serviço nas ótimas "The Outsiders", urgente e nervosa, "The Greatest Diner", e "House of Mirrors", todas com Jez Williams arrebentando na guitarra.

E se vocês sentirem um eco de U2 na hipnótica "Winter Hill", não estranhem, é porque esses caras do Doves sabem o que fazem e querem ir longe. Valeu a espera. E vale também a minha nota:

Cotação: 5

Caia na rede:

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sexta-feira, 10 de abril de 2009

Força da natureza

Neko Case é daquelas raras artistas que escolhem uma direção e seguem o rumo sem se desviar. É coerente com o universo country e folk que a orienta desde seu primeiro trabalho, um ensaio chamado The Virginian, de 1997. Remete assim a musas instituídas do gênero, como Joni Mitchell, Rickie Lee Jones e Aimee Mann, sempre dispostas a experimentar, mas mantendo fortemente suas raízes musicais. Em Middle Cyclone (2009), a norte-americana empreende um sucessor a altura do lindo Fox Confessor Brings the Flood(2006).

A capa do disco, uma das mais bacanas que vi este ano, com Case fazendo a linha dominadora montada num capô de um velho Mercury Cougar com uma espada na mão, podia até sugerir um trabalho mais ousado, moderno. Não rola. O que se vê é a cantora destilando suaves canções, acompanhadas de cellos, como na linda "Never Turn Your Back on Mother Earth", country com sofisticação, ou na tocante "Polar Nettles", na qual uma bateria marcial faz um instigante contraste com uma clarineta.

Classuda, Case oferece algumas de suas mais inspiradas composições, como a que dá nome ao CD, "Middle Cyclone", ou a soturna "Prison Girls", uma história de amor contada por meio de uma carta. A natureza, ou pelo menos sua presença intangível em nossas vidas, se faz presente em boa parte das músicas. Para reforçar esse clima, a artista é capaz de reunir uma orquestra de pianos, seis ao todo, como em “Don’t Forget Me”, uma das mais fraquinhas do disco. Uma pequena derrapada que não ameaça o vigor de Middle Cyclone.

Aliás, existe uma outra bobagem no álbum. Os 31 inacreditáveis minutos de bichogrilismo na última faixa, “Marais la Nuit”, com o som ininterrupto de grilos e sapos. Tudo bem que a natureza rege o conceito do disco, mas não precisava tanto. Pule essa encheção de saco e volte a primeira faixa para se deliciar com a boa música de Neko Case.

Cotação: 4

Oriente-se:

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Aqui também dá:

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Ou, por fim:

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quarta-feira, 8 de abril de 2009

Vôo corajoso

Todo ano aparece uma leva de novas cantoras brasileiras, algumas a reboque de uma produção que descaracteriza a artista, e outras que se oferecem ao público sem efeitos especiais e com muita coragem. Tiê faz parte desse último time. A bela mocinha lançou recentemente seu primeiro trabalho Sweet Jardim, bem acústico e low-fi, amparado apenas pela voz pequena da paulistana, um violão, uma guitarra aqui, um piano acolá e outros poucos instrumentos.

Sweet Jardim é uma surpreendente lição de simplicidade e talento. Com ecos de folk, apesar da cantora negar essa tendência, Tiê mergulha em letras confessionais com melodias suaves e despretensiosas. E talvez seja isso que encante. Como em “Passarinho”, onde ela brinca com o próprio nome na poesia montada em melodia marcante: “Quando mamãe olhou pra mim, ela foi e pensou, que um nome de passarinho me encheria de amor. Mas passarinho, se não bate a asa logo pia, e eu, que tinha um nome diferente, já quis ser Maria”. E complementa faceira: “Ah, como é bom voar.”

Tiê se investe de romantismo, sem qualquer acento piegas, em quase todas as suas letras. A compositora fala de si mesmo, revelando sem medo clássicos desejos, como na bela “Chá Verde”, onde canta e toca piano, acompanhada de um coro de vozes de amigos: “Mas o que eu penso mesmo, é encontrar alguém, que me dê carinho e beijos, e me trate como um neném. Me trate muito bem”. Também em “Te Valorizo” (veja clip na barra de vídeo ao lado), uma das melhores do álbum, ela aguarda alguém que a encha de beijos. Será que ninguém se habilita?

Nada supera, contudo, o acerto da melodia e letra de “A Bailariana e o Astronauta”, uma das mais tocantes e inspiradas do CD. A tristeza de música, arredondada por sutis cello e vibrafone, é contrabalanceada pela poesia, uma bem contada história de amor e esperança. Tiê, com sua voz mansa e que lembra a da mineira Fernanda Takai, tem habilidade para arquitetar composições que tocam a alma. E com Sweet Jardim ela empreende um vôo musical que pode levá-la longe.

Cotação: 3

Voe junto, mas antes copie e cole:

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terça-feira, 7 de abril de 2009

De volta ao começo

De volta as resenhas de disco, a primeira em 2009, depois de um longo e tenebroso inverno. E começo com o último de uma banda que sempre me agradou, And You Will Know us by The Trail of Dead, apesar da instabilidade criativa desses texanos. Acho superbacana o Source, Tags & Codes, discaço de 2002, aliás, o preferido – e com razão – dos fãs mais fiéis.

Os caras lançaram no início deste ano um trabalho chamado The Century of Self, no qual recobram, a meu ver, parte da energia que caracterizou o início da carreira da banda. Pra quem não conhece, os norte-americanos do You Will Know... primam por uma sonoridade multifacetada, onde guitarras distorcidas e barulheira sônica promove um inusitado e inesperado casamento com orquestrações e pianos delicados.

E não é que os sujeitos tomaram um chá de inspiração e se recuperaram das bobagens que produziram nos últimos três anos. The Century of Self começa com “Giants Causeway”, música instrumental de primeira, grandiloqüente e melodiosa, assim como aconteceu na abertura da já citada obra-prima Sources Tags & Codes.

O bom sinal anima o ouvinte. Até porque, as três músicas seguintes, “Far Pavillions”, “Isis Unveiled” e “Halcyon Days”, com destaque para a última, encontra a banda afiada, fazendo sua típica musica com muitas quebras de andamento, melodia pegajosa, arranjos redondos e buliçosos. Tem espaço até para citação da clássica Bolero, de Ravel, em uma delas, sem falar nas viagens psicodélicas que remetem aos loucos anos 70.

Lá pelo meio, o disco vai perdendo um pouco a força e ganhando apelo pop (!) quando entra no universo das baladas. Não que a banda tenha que ser sempre esfuziante, mas ela é mais eficiente quando faz barulho. Ainda mais com o agravante do vocal de Conrad Keilly, com timbre parecido com o de Perry Farrell, do Jane’s Addiction, não ser lá muito marcante. Mas, há que se chamar atenção para as lindas “Inland Sea” e “Ascending”, duas das melhores do disco.

Entre mortos e feridos, The Century of Self é um sopro de renovação dessa banda que ganhou lugar cativo no coração de muita gente. Mesmo não sendo uma brastemp, dá pra ouvir com gosto.

Cotação: 4

Vá lá no ctrl C ctrl V:

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quinta-feira, 2 de abril de 2009

Dando a cara a bofete

Roberto Carlos de cueca samba canção fica mal na foto? Que nada. Pelo menos é o que pode ser percebido no divertido site http://www.sleevefacebrasil.blogspot.com/. A idéia é simples e funciona muito bem. Pegue uma capa ou mais do bom e velho vinil, “acople” ao seu corpo ou de um amigo e peça alguém para fotografar. O resultado são fãs ou meros tiradores de onda emprestando parte do corpo para personificar um ídolo da música pop.

Impossível não abrir um sorriso vendo a moçoila dando uma de Chispita(alguém lembra?) ou um marmanjo imitando o Johnny Mathis segurando um fofo ursinho de pelúcia na mão ou até mesmo nosso “rei” Roberto (foto acima), na pele de um criativo fã, numa situação nada nobre. Tudo feito com composições de capas de disco. Um grande barato. Vá no blog, que foi uma dica do krebão (valeu, cara), e se divirta.