Gosto de quem escreve certo por linhas tortas, dos corações inquietos que não se bastam do bem feito e quer este feito ainda melhorado. Dos que fazem do trabalho incansável experiência de aperfeiçoamento porque aqui, como no
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O Menomena ainda com Brent Knopf: quatro discos lançados |
Veja
sessão acústica de "Heavy is as Heavy Does":
Harris e
Seim fizeram o que considero o
melhor disco do Menomena porque
usaram sua criatividade e poder de fogo para ficar mais perto da maioria.
Porque antes haviam os dois e Brent
Knopf, uma das forças motrizes da banda, que saiu em 2010 para se dedicar
ao bom grupo Ramona Falls. E com os
três havia um projeto mais maduro que se iniciou com o cultuado, e muito
legal, Friends and Foe(2007), o primeiro que ouvi da galera, carregado
dessa vontade de fazer música com uma dose de invenção que afastava sua obra
dos ouvidos mais preguiçosos. Esse rock com gosto pelo experimental, por
levadas menos óbvias se fez presente também em Mines(2010), álbum que manteve acesso a chama dos fãs pelo grupo. A
saída de Knopf ajudou na diminuição da febre, do ardor que
movia a criação dos caras? Acredito que não. Porque parte da criatividade vista
nos CDs anteriores se mantém intacta, apenas com a ansiedade um pouco mais
domada, dominada. A dupla que continua a tocar o Menomena articulou no mais recente trabalho uma sonoridade mais
solar e simples, ainda que algumas músicas vistam-se daquela estranheza e
melancolia que a trupe sempre soube produziu.
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Grupo mantem padrão com belos arranjos e orquestrações |
Mas, fique atento, nada em Menomena é o que parece. O que, na primeira audição, reveste-se de
simplicidade, na segunda, com os ouvidos mais atentos, mostra-se cheio de
nuances, com as garras expostas. Existe um universo complexo por trás das
canções, ainda que ele assuste menos, do grupo. Os arranjos muito bem
trabalhados, as mudanças de andamento das composições, a surpresa que nos é
reservada aqui e ali com a introdução de instrumentos pouco comuns ao gênero
rock, tudo faz com que Moms torne-se
um deleite para quem é ávido por música com conteúdo, feita de uma substância
mais reativa e consistente. Como descobrir o ácido da fruta depois da sensação
do doce. É assim, por exemplo, com a impressionante "Heavy is as Heavy
Does", que começa levinha com seu piano manso, entorpecendo o ouvinte até
a mudança lá na frente com o crescendo do coro que deságua em guitarras
distorcidas, no talo. De uma beleza concreta. Da mesma linhagem "One
Horse", que fecha épica o disco com
seus dez minutos de absoluta extravagância.
Aqui fica mais clara ainda a alternância melódica, com momentos
atmosféricos dividindo o tempo com arranjo de cordas e a batera e guitarras
fazendo a mais sublime diferença.
Ouça "Don't Mess with Latexas":
Esses caras sabem mesmo causar impressão. Além dos
movimentos que dividem as canções, outra das características mais notáveis é o
apreço que têm por arranjos instrumentais que pega o ouvinte de surpresa. Se em
"One Horse", a orquestração das cordas eleva a voltagem da canção,
reafirmando sua tensão melancólica, em "Plumage", que abre o álbum e que
se sobressai como uma das mais pops do repertório, quem dá o ar da graça é um
inesperado e animado sax. Em "Pique", que tem também um apelo
popular, são os instrumentos de sopro que se apresentam, colorindo essa música com
seu tom mais radiofônico. Todas essas, apesar da moldura simples, tem sempre um
ou outro elemento, um toque, um barulhinho que denotam a riqueza dos arranjos.
E isso fica mais claro ainda em gemas como a preciosa "Don't Mess with
Latexas" e suas cordas libertárias e a ensimesmada "Tantalus",
na qual a guitarra e bateria, um show a parte no álbum, fazem magnífico
contraponto com um teclado mais gutural, desses que fazem a festa em filmes de
suspense. A complexidade dos arranjos torna-se uma deliciosa brincadeira para
quem ouve "Moms", para quem gosta de explorar ricas trilhas musicais
que alternam clareiras e mata cerrada, num emaranhado de sons no qual vale a
pena se perder e se achar.
A riqueza das referências e a dinâmica das melodias
garantem grandes momentos ao álbum. Se não bastasse, a dupla Harris e Saim ainda se meteram a fazer um disco temático. Claro que a idéia
não é nova, mas é, no mínimo, diferente na intenção. O título do disco, Moms, mães em inglês, não é de graça. Os
dois músicos resolveram explorar audaciosamente nas letras desse trabalho, o
relacionamento que tiveram com suas progenitoras. O vocalista foi criado por
uma mãe solteira, enquanto o outro perdeu a sua quando ainda era jovem. É pano
pra manga pra nenhum freudiano botar defeito. E o ouvinte vira espectador
passivo e interessado desses testemunhais, dessa expurgação pública. Os recados
são diretos, precisos, como em "Capsule", em que confessam cheios de
autopiedade: "Agora eu estou evoluindo de uma criança nova para uma
criança envelhecida/Você está amadurecendo de uma memória para um legado".
Ou então, metaforizando sem piedade o passado familiar: "Todos os ramos
pendurados em minha fudida árvore da família são pesados", cantam em
"Heavy is as Heavy Does". Menomena
é isso: entrega e mergulho. Moms é
assim, um álbum para se curtir devagar, entendendo todos os seus significados,
dores e beleza. Um discaço.
Cotação: 5
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