Existe um gênero musical que marcou os anos 90 do século passado ao mergulhar consubstancialmente tristeza em um mar de eletrônica e estranheza. Sonoridade depressiva contraposta a grooves e batidas que produziam doce contraste e contundência. A proposta partiu do coletivo Massive Attack, um grupo da cidade inglesa de Bristol, e foi batizada na época de trip hop. Desde o primeiro álbum, Blue Line(1991), o grupo lançou apenas cinco trabalhos, todos cercados de grande expectativa. O último acaba de sair do forno, Heligoland(2010), um trabalho de fôlego que reforça a fidelidade do duo Robert “3D” Del Naja e Grant “Daddy G” Marshall, sobreviventes da formação original, a música viajandona que ajudaram a criar.
Não existem grandes novidades ou traços evolutivos em Heligoland, que chegou sete anos depois do bom 100th Window (2003). E isso, que fique bem claro, não é depreciativo. Quem conhece o Massive Attack sabe que a maçaroca climática que produzem é por si um belo presente para ouvintes de bom gosto. É uma fórmula complexa que, se bem repetida, já vale o dinheiro gasto no CD original. No último disco do grupo, os arranjos super bem elaborados, o alto nível da produção e a inspiração afiada de Del Naja e Daddy G Marshall, que se cercaram de convidados de estirpe nobre, garantem uma boa viagem aos fãs e a sobrevida de um gênero musical cultuado no passado, mas que veio perdendo espaço nesta década.
E a viagem começa muito bem com "Pray of Rain" que resgata toda a força do trip hop, da aspereza soturna da atmosfera que a melodia cria ao uso estudado dos barulhinhos eletrônicos. Acompanhado de uma bateria tribal e um baixo bem marcado, o convidado Tunde Adebimpe, da ótima banda Tv on the Radio, empresta sua voz para interpretar uma melodia que começa melancólica e ganha pinceladas mais alegres lá na frente, num delicado crescendo. É Massive Attack como antigamente. Mesmo espírito de “Paradise Circus”, marcada por palminhas, uma programação eletrônica minimalista e a voz suave, quase infantil de Hope Sandoval. Da mesma lavra da bela “Babel”, com uma Martina Topley-Bird, pioneira do trip hop, esvaindo-se em sensualidade na batida de um drum’n’bass viajandão em composição de arrepiar.
O Massive Attack explora com sobras o terreno do trip hop de raiz em quase todo o álbum. E belisca referências do groove negrão, da black music, que só ajudam a tornar as músicas ainda mais sedutoras e chapantes. Caso de “Splitting the Atom”, uma das mais legais desse Heligoland, com o jamaicano Horace Andy mesclando sua voz a batidas eletrônicas hipnotizantes em uma levada meio soul. Del Naja e Daddy G Marshall buscam ainda inspiração em outras praias, como na interessante “Girl I Love You”, na qual é possível perceber ecos de música indiana. No mais, encaram suas viagens de cara lavada e até com alguma leveza, como na bem arranjada “Psiche”, com um início arrebatador e a ótima Martina Topley-Bird mostrando mais uma vez sua afinada arte de encantar.
Heligoland só não é cem por cento porque há algumas viagens na maionese. A maior delas é a experimental “Flat of the Blady”, que destoa de todo o resto do álbum com seu opressor estranhamento e um Guy Garvey, da bacanuda banda Elbow, cantando desleixadamente e tornando a canção ainda mais incômoda aos ouvidos. Del Naja assume os vocais na tensa e arrastadíssima “Rush Minute”, outra decepção, que se perde na arrogância dark de sua construção. E por pouco Damon Albarn, do Blur e Gorillaz, fora do tom, não estraga a inspirada e contundente “Saturday Come Slow”. Nada disso, porém, tira o brilho dessa incursão musical profundeza adentro desses ingleses bons de bola. Valeu a espera de sete anos: Heligoland está a altura de seus criadores e a gente tem mais é que agradecer.
Cotação: 4
Entre na roda:
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Escute "Pray for Rain":
Vale a pena ouvir também "Psyche":
Assista a filme inspirado em "Saturday Come Slow":
Este blog é uma manifestação de amor à música. Não tem caráter comercial, mas apenas o de compartilhar um gosto pessoal por grupos, bandas e artistas de todo o mundo. A idéia não é detonar a indústria fonográfica, como alguns blogueiros acreditam que possam fazer ao postar discos. Sugiro que esse blog sirva como mera pesquisa e, se gostar dos trabalhos comentados, procure comprar. É um mimo que você faz ao artista.
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