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Cave está de volta com toda a sua melancolia e beleza |
Para Wagner Ataídes
Um alemão maluco numa tarde cinzenta numa Brasília sem engarrafamentos me apresentou Nick Cave. Eram dias derradeiros dos anos oitenta e eu, cheio da irrefreável sede do conhecimento, atado e atento ao que o mundo me oferecia de mãos beijadas. O louco alemão falou de Cave com sua também voz cavernosa, naquele seu dialeto que misturava sua língua pátria com a minha língua mátria, entrecruzando expressões meio incompreensíveis entre os dentes encardidos de nicotina. Consegui, enfim, entender um “você vai gostar” bem pronunciado e decidido. Para quem já havia me apresentado The Smiths, tinha que dar crédito para o cara. Comprei a bolacha do Kicking Against the Pricks(1986) e botei pra girar na vitrolinha, depois de encarar intrigado um sujeito na capa do disco de black tie e um topete gigantesco envolto num ambiente esfumaçado de cabaré. Era um álbum de covers com versões nebulosas, às vezes experimentais, às vezes farsescas de músicas de gente boa. John Lee Hooker, Johnny Cash, Tom Springfield, Lou Reed dançando nos sulcos do vinil em catárticas e raivosas interpretações. Pensei, o louco alemão tinha razão, aquele australiano era realmente bom pra caralho.
Um alemão maluco numa tarde cinzenta numa Brasília sem engarrafamentos me apresentou Nick Cave. Eram dias derradeiros dos anos oitenta e eu, cheio da irrefreável sede do conhecimento, atado e atento ao que o mundo me oferecia de mãos beijadas. O louco alemão falou de Cave com sua também voz cavernosa, naquele seu dialeto que misturava sua língua pátria com a minha língua mátria, entrecruzando expressões meio incompreensíveis entre os dentes encardidos de nicotina. Consegui, enfim, entender um “você vai gostar” bem pronunciado e decidido. Para quem já havia me apresentado The Smiths, tinha que dar crédito para o cara. Comprei a bolacha do Kicking Against the Pricks(1986) e botei pra girar na vitrolinha, depois de encarar intrigado um sujeito na capa do disco de black tie e um topete gigantesco envolto num ambiente esfumaçado de cabaré. Era um álbum de covers com versões nebulosas, às vezes experimentais, às vezes farsescas de músicas de gente boa. John Lee Hooker, Johnny Cash, Tom Springfield, Lou Reed dançando nos sulcos do vinil em catárticas e raivosas interpretações. Pensei, o louco alemão tinha razão, aquele australiano era realmente bom pra caralho.
Veja o vídeo de “Jubilee Street”:
E esse Cave do alto de sua eterna magreza foi me surpreendendo a cada
disco rodado, confirmando de vez minha admiração num show que fez para poucos
agraciados numa virada de década debaixo de uma lona de circo em Brasília
montada para shows populares. Tender Prey(1988),
Henry´s Dream(1990), Murder Balads(1996), só para citar
alguns exemplos, traziam um músico inteiro, bem intencionado, de voz marcante e
afinada, acompanhado de uma super banda, os fabulosos The Bad Seeds. Que cantor
e compositor não gostaria de estar acompanhado daqueles caras talentosos?
Juntos fizeram álbuns antológicos, nos quais Cave exorcizava fantasmas, cantava sobre deserdados, sentimentos
periféricos, assassinos, a crueza da vida e, claro, o amor sem muitas
concessões. De uma tal forma que pesava no coração e rodopiava latente na
cabeça. Parte desse universo, do sentimento de urgência e principalmente da
melancolia que trespassava a música como flechas sorrateiras está presente de
forma estupenda em Push the Sky Away(2013),
o último e mais um acerto de Cave e as más sementes nesse que é o 15 álbum de
estúdio deles.
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Cave ao lado de uma das melhores bandas de apoio da terra |
Não que fosse inesperado, mas depois
de uma série de obras em que se esbaldaram, feito crianças num grande parque de
diversôes, num rock ligeiro e insidioso, caso dos discos Dig, Lazarus Dig!!!(2008) e os dois que assinaram como Grinderman, um projeto paralelo, muitos
acharam que Cave e The Bad Seeds iriam engrenar uma quarta
marcha. E continuar acelerando as batidas da batera e do coração. Que nada. O
cara e a banda trouxeram de volta aquele som soturno, em marcha lenta, marcial.
Minimalista, o músico canta noturnos num tom menor que, apesar disso, não tira
a grandiosidade e a estranha beleza de suas composições. A noite se faz cercada
de um sentimento taludo, de tão triste e melancólico é quase palpável, como uma
carne a se cortar. E a voz, mais segura do que nunca, ressaltada pela
delicadeza instrumental, repetitiva e hipnótica torna os ouvidos reféns das
histórias e do universo denso e introspectivo, cheio de sereias, devaneios e
alma desnuda do australiano.
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Cave: trinta anos de carreira e vários álbuns antológicos |
Push The Sky Away é
mais do que rock. Transcende esse rótulo e reforça a coerência, explícita em 30
anos de carreira, de Nick Cave e sua
incrível banda em dialogar diretamente, abertamente com aquilo que mexe
profundamente com eles. São dores, cores, tesões traduzidos em uma música
redentora. É talvez redenção para o grupo que a toca. É presente para quem a
ouve embevecido e agradecido. Um dia um maluco alemão me apresentou Nick Cave. Há 25 anos. Num desses dias
cinzentos de 2013 da mesma Brasília, um amigo daquela época me alertou para
ouvir o novo álbum do cara e sua banda de lá. “Acho que você vai gostar”, disse
sem sotaque e com a firmeza de quem confia no que diz. E eu sempre dei crédito –
por tudo que escutamos e amamos juntos - para a sensibilidade dele. Aquele
sentimento de força e beleza atravessou décadas e hoje se renova como se o
tempo tivesse parado. Acho que é assim com a música boa, como uma fonte de
juventude. Vai ser sempre assim.
Cotação: 4
Tente o download por aqui:
http://www.mediafire.com/download/1vm5axm1one8mvl/Nick_Away.rar
Cotação: 4
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