quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Mexidão substancioso

Uma feira musical colorida e divertida, onde de tudo tem um pouco. Tem ska, dub, jazz, blues, salsa, polca, bolero e outras cositas mais, tão amalgadas e finamente misturadas que é impossível resistir ao seu esperto groove. Os meninos do Sobrado 112 já haviam ameaçado fazer um bom disco com a estréia, emblematicamente chamado de Desmanche(2007 - Leia resenha aqui no blog), com essa salada sonora. O rascunho virou arte final em Isso Nunca me Aconteceu Hoje(Oi Música), lançado no ocaso de 2009. Aqui, os seis integrantes do grupo(todos na foto de João Salomão) criado no bairro carioca da Glória refinam a fórmula e encontram o ponto de equilíbrio desse substancioso angu onde a brasilidade, no final das contas, é o maior e melhor tempero.

A proposta da mistureba feita pelo Sobrado 112 é reforçada pelo próprio grupo. Eles gostam mesmo de fazer uso, e um bom uso, das influências rítmicas produzidas na Jamaica, Caribe, sul dos Estados Unidos, a retorcida música dos balcãs e, é claro, na terra mater. E é o talento brasileiro de dosar tantas referências com suíngue incomum que faz a diferença. Porque o batuque, o DNA do sangue negro que formatou a música genuinamente verde amarela, é que acaba orientando a folia da banda. É uma espécie de farra orgiástica, onde a efusividade das melodias, com mudanças bruscas de andamento, surpreende ao mesmo tempo que seduz. Esses loucos do Sobrado sabem mesmo se divertir, e, para gostar do álbum basta ter disposição para provar todos seus sabores.

E por falar em sabores, o “dia” de Isso Nunca me Aconteceu Hoje começa com um bom café, “preto do bom, para acordar”, como diz a letra pragmática e pueril da música de abertura. Os metais dão o tom e o brilho, característica detectada em todo o álbum, da canção que mistura sons caribenhos e ragga. O skacore come solto depois da introdução funkeada da bacana "Eu não Quero ter Razão", bom aperitivo para a catártica, na seqüência, "Duas de Cinco", onde a suruba do funk, reggae e polca fazem uma delirante festa. Na letra emaconhada desta última, as senhas esfumaçantes estão em todos os lugares. “Camarão”, “pilão” e “seda” fazem parte da encomenda pedida a um tal de Marco, intimado a trazer também “duas de cinco”, aproveitando que o cara está mesmo descendo o morro.

Mas, no segundo disco do Sobrado 112, não se apegue muito as letras idiossincráticas das composições. Elas são despretenciosas e dispensam a preocupação, presente de leve no primeiro álbum da galera, com a temática social. Tipo: relaxe e, simplesmente, sinta o groove. Elas são algumas vezes como espécies de elementos percussivos para a folia de ritmos proposta pela banda. Ouça, por exemplo, “Grajaú”. Nessa divertida música, a galera explora a rica sonoridade do português, aproveitando ainda a ludicidade das gírias, para contar a história de duas pessoas que passam um perrengue na periferia: “Eu e tu lá no Grajaú, sem tutu, tu para o buzú(tradução pra quem não sabe: ônibus)”. Tudo soa como um grande batuque. Ou seja, siga o ritmo.

Dessa forma, legal mesmo é se deliciar com o mix musical de petardos como a ótima “Amoroso”, onde o Sobrado, amparado num “riff” soberbo construído pelos metais chama pra dança. A fervura da latinidade, com direito a uma desbragada declamação em espanhol no final da canção, casa com perfeição à contagiante e elétrica polca. Ou no dub com pitadas de jazz de “Cabeça de Nego”. Ou até mesmo no elegante samba jazz de “Narcisa”. Enfim, deixe-se levar, aceitando que em nós, brasileiros, há mesmo essa condescendência rítmica que nos amamentou desde tenra idade. O Sobrado 112 assume essa tendência e faz de seu Isso Nunca me Aconteceu Hoje um trabalho digno. Mas ainda não definitivo. Se continuarem a progredir, como mostraram no último álbum, temos muito a ganhar.

Em tempo: parte dos louros desse bom disco pode ser creditado a BID, produtor que ajudou a construir, entre outros, Afrociberdelia, obra-prima de Chico Science e Nação Zumbi. O cabra é talentoso. Sobrado 112 é habitado pelos também talentosos Vitinho(violão, guitarra e voz), Leandro Joaquim(trompete,flugelhorn e voz), Claudio Fantinato(percussão), Pedro Dantas(baixo), Maurício Calmon(bateria) e Miguel Martins(guitarra e vocal).

Cotação: 4

Caia na gandaia:

http://www.4shared.com/file/190782105/2a058232/SOBRADO_112__2009_-_Isso_Nunca.html

http://www.4shared.com/file/163663879/473b61c1/2009_Isso_Nunca_me_Aconteceu_H.html

http://www.mediafire.com/?qywhn51trw4

Escute “Eu não quero ter razão:



Escute também "Grajaú":



Se tiver ainda um tempinho ouça "Amoroso":



Veja vídeo com a música "Café":

8 comentários:

Maurício C. disse...

muito obrigado pela sua sagaz análise do nosso trabalho. são críticas assim que de fato informam, sem deformar ou manipular. parabéns!

DR.TÍMPANO - BSB/DF disse...

Obrigadão, Maurício. Mas, o que vale mesmo é ajudar a tornar bons trabalhos, que nem o de vocês, conhecido por mais gente. Essa é nossa singela missão. E vamos pra frente, que pra trás vez gente!

Mig Martins disse...

Valeu mesmo! Curti beça o texto. Só faltou dizer que o guitarrista tb canta.. Abraço! Td de bom!

Mig

Unknown disse...

valeu irmão!
muito obrigado pela crítica super positiva!!!
valeu mesmo!!

fiquei muito feliz quando li!

grande abraço!

Mig Martins disse...

Crítica nada, me amarrei :)!!!

abraço!

Unknown disse...

meu irmão..vc arrasou na analise doque fazemos...encontrou respostas e links para nossa musica que é dificil até pra gente definir!!!
tamo junto...e pra frente...sempre
abraço
leandro joaquim- sobrado 112

Camila Bahiense disse...

Ganhei o disco novo do Sobrado e posso dizer que é muito legal mesmo. Fiz um pequeno comentário deles em meu blog pessoal mas nada que se compare a uma critica ótima como essa. Estão todos de parabéns, inclusive o Sobrado que consegue fazer músicas para todas as idades. Beijos para todos.

aline disse...

Aê! Gostei do "substancioso"!!