terça-feira, 14 de julho de 2009

Regurgitando o passado

Estava com saudades de ouvir um trip hop genuíno, carregado daquela melancolia avassaladora que escorre entre cada nota da música, entre cada frase suspirada. Aquelas canções doídas, downtempo, assombrosas em suas viscerais viagens alma adentro. Dei de cara então com The 39 Steps, um duo inglês que lançou seu primeiro projeto sonoro, o álbum Coming Clean (2009), um disco que tenta retomar a magia criada por pioneiros do gênero, os excepcionais Moloko e Portishead.

O que é legal em Coming Clean é que o DJ e produtor inglês Kato e a cantora convidada Laura Fowles não buscam dourar a pílula nem inventar a roda. Apesar do autor do projeto chamar a música que faz de “Dark Soul”, talvez apenas para efeito de marketing, o que há na verdade é uma puta reverência ao trip hop de raiz, aquele que sufoca o fã do gênero com fartas injeções de tristeza e estranhamento.

Impossível não remeter a música da dupla aos primeiros passos de Portishead e Moloko na construção musical do trip hop. Do primeiro, é possível pescar com vara curta a melancolia e clima opressivo, incluindo detalhes como o barulho de vinil riscado, em músicas como a linda “I'll Be There” ou na seqüência impressionante de “The Pinch” e “Piano Killer”. Nessas duas, a paisagem soturna toma conta do ambiente com a voz firme de Fowles ora pendendo para um timbre infantil ora indo para o sensual, Lolita de todo. Repare ainda no efeito “voz dentro de caixa” que torna tudo mais estranho e instigante.

De Moloko, vem o lado mais solar e pop de Coming Clean, se é que podemos perseguir algumas réstias de luz nele. Mais palatáveis, composições como “Road To Where?” e a cinematográfica “Ghost Writing”, classuda e estilosa, dão um descanso ao castigado coração do ouvinte. Há ainda esparsos momentos em que The 39 Steps buscam inspirações no jazz, como na cool “Since You”, uma tentativa que acaba sendo soterrada, no frigir dos ovos, pelas pás de programação eletrônica jogada veementemente por Kato (o cara da foto).

A comparação com Portishead e Moloko não significa que temos aqui um disco à altura dos que fizeram aqueles no limiar do trip hop. Mas, Coming Clean é um álbum digno, bem arranjado e com uma vocalista escolhida a dedo. Daqueles que nos faz lembrar que o gênero em questão nunca vai cair em desuso e que ainda pode render obras de grande apelo emocional. Vale escutar, mas, sempre tentando resguardar o coração, viu.

Cotação: 3

Abandone-se:

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