segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Eles estão certos

A voz doce e firme de Lisa Von Billerbeck é como um chamado irrecusável à navegação em mares brandos diante de um pôr de sol que tudo pereniza. Foi assim que me senti - do alto de minha pachorra, headphone no ouvido e os pés riscando o Rio Branco no domingo de vento amigo numa calorenta Boa Vista - logo depois da primeira audição do álbum no qual impera a voz da moça de cabelo curtinho da foto aí de cima. As canções folks e acústicas da banda alemão I Might be Wrong em seu segundo trabalho, Circle the Yes(2009), me provocaram um certo niilismo, uma vontade de se abandonar diante da leveza pop e melódica do grupo. É como se repente Lisa fosse uma Elizabeth Fraser, da psicodélica e inesquecível Cocteau Twins, teletransportada para os anos 2000 em ataques de franca alegria.

Circle the Yes é um álbum de pura suavidade e pouca gravidade. Lisa Billerbeck flutua soberana nas canções, domando com destreza as guitarras acústicas, quase sempre dedilhadas, e o baixo e bateria discretos que amplificam ainda mais o clima de delicadeza do CD. A vocalista é a grande força motriz de toda essa história.“A Propos” tem, por exemplo, a pegada cool que me fez lembrar, voltando novamente a década de 80 do século passado, o exercício jazzy dos ingleses do Style Council. “A Penny for Your Thoughts” tem construção melódica precisa, arrematada por um belo piano. A mais animada “Jalopy” com sua guitarra meio “oitentista” mostra que os berlinenses têm instrumentos afiados e coerência na proposta musical que arranha o psicodelismo e abraça forte o dream pop, gênero marcado pela atmosfera solar.

Acredito que muitos vão achar o disco da banda alemã cansativo, até meio chato. Talvez porque o álbum é irritantemente coerente e homogêneo em seu conceito de fazer um som açucarado e melodioso, sem reviravoltas, microfonias ou invencionices. Mas, nem de longe Circle the Yes chega a ser enjoativo. Dentro de sua homogeneidade há variações – sutis ou até mesmo mais escancaradas – que podem ser sentidas, dependendo, é claro, da boa vontade e da cultura musical do ouvinte. Em “Checov”, por exemplo, uma linda introdução de guitarra convida Lisa para uma canção quase falada, sensual e provocativa. “Salomon”, para mim uma das melhores do disco, dosa tristeza e energia vital com equilíbrio, deixando aquela sensação que nos propicia a mistura excitante do doce e salgado na boca.

Li em algum lugar, não lembro onde exatamente, o texto de alguém buscando uma comparação entre o som da banda alemã e os experimentos sonoros do aclamado Radiohead, que compôs a música “I Might be Wrong”. A marcante música de Thom Yorke pode até ter sido a inspiração para o nome do grupo de Berlin e sugere a tentativa de aproximações, mas não há muitas intersecções entre um e outro. “Woodpecker” com sua bateria dura em contraste com a guitarra mais sinuosa pode até sugerir alguma semelhança entre os dois. Mas, Circle The Yes é um trabalho calcado na linda voz de Lisa Von Billerbeck e em um instrumental menos barroco e complexo, amparado basicamente na leveza e em melodias mais diretas. Nesse sentido, a banda sabe ser objetiva e faz bem seu dever de casa.

Cotação: 4

Confira se estou certo em minha avaliação:

http://www.easy-share.com/1908072028/I