sábado, 7 de novembro de 2009

De volta pro aconchego

A bola no gol e o eco do grito de dezenas de torcedores ribombando embaixo da mangueira alheia a tudo. A velha e solene mangueira no barzinho sujinho e repleto de gente de preto e branco e uma cruz de malta brilhando no peito trêmulo de orgulho. O impávido gol ateando fogo na paixão. Gente que nunca se viu se abraçando como se todos fossem conhecidos de longa data. Que engraçado, né? Que mágica doce. Futebol é isso. Essa magia besta e cotidiana que acontece no instante em que a danadinha resolve rir do goleiro e estaciona ali entre as traves, estática, alheia como a mangueira. Sábado, sete de novembro de 2009 e o Vasco, ou melhor, enchendo o peito com todo o oxigênio que me é possível, o Vascão reocupa seu lugar no olimpo do futebol brasileiro.

Nunca joguei futebol. Nunca quis. Sou perna de pau, mas gosto de assistir a uma partida bem jogada. Assisti a vitória do Vasco sobre o Juventude por 2 a 1 no bar sujinho que não tem nome, do Adilton, um cearense pançudo, simpático e completamente despreparado para administrar um estabelecimento daquele tipo. Bar ao deus dará. Mas, Vascaíno convicto, teve a competência para juntar apaixonados como ele. E foi essa gente, uniformizada como que para um desfile, que foi se juntando no quintal da mangueira alheia, ocupando cada metro com sua palpável e densa expectativa de ver o time do coração voltar a série A do campeonato de futebol nacional mais visceral e sanguíneo do planeta. Chão de terra batida, a cerveja solta e olhos ávidos grudados na tela da televisão em completa sinergia, uma comunhão potente, eclesiástica. Uma missa e uma missão.

A missão, cumprida. Teve lágrimas nos olhos. Marmanjos chorando de emoção sob os olhos incrédulos dos pequenos filhos, fardados como o pai, alheios ao impacto da vitória rasgando o peito daquele cara tão menino. Que engraçado. Que mágica pura. Teve riso solto, buzinas alucinadas em carros alheios a tamanha alegria. A alegria da recompensa depois da sofrida tragédia, com todos os elementos da gênese grega, de ter sido rebaixado. Rebaixado. Que palavra feia. Agourenta. Agora, a remissão. Que palavra bonita. Vasco fênix, afastando uma doída tristeza do passado. E depois do final, a partida acabada depois do fim no bar sujinho sem nome, nem havia mais a televisão, aquele aparelho anguloso que sugou toda a nossa atenção por ansiosos 90 minutos. Havia a felicidade. E ela nos bastou. A cruz de malta avermelhada, cor de sangue, impressa nos corações acelerados pode enfim dormir, na noite de sete de novembro de 2009, em paz.