domingo, 13 de setembro de 2009

Vendo corações partidos

A dor de cotovelo é tão antiga quanto à humanidade. Desde que o homem começou a raciocinar e a amar, desde que do outro lado da ponte havia alguém do sexo oposto, ou do mesmo sexo, disposto a um relacionamento amoroso, o coração sempre correu riscos. Pobre dele. E quando as decepções amorosas surgem, quem já passou por elas sabe, nascem dores abissais, certificados de fracasso e angústia pendurados na parede da alma. Mas, como, a gente também tem o dom do renascimento tão forte quanto à propensão a dor, fomentamos, mesmo nadando num vale de lágrimas, a vital esperança.

Esse sentimento de perda contraposto a luz no fim do túnel é o combustível aditivado de The First Days of Spring(2009), o segundo trabalho, depois de Peaceful, The World Lays Me Dow(2008), de Noah and the Whale, uma banda que está conquistando cada vez mais espaço entre os indies. O álbum, coeso em sua proposta, parece ter sido engendrado por alguém que estava passando por um profundo perrengue sentimental. Vai ver Charlie Fink, vocalista e principal compositor da banda, estivesse vivendo uma daquelas desilusões amorosas cinematográficas e o que é melhor, para nós ouvintes, disposto a reparti-la com o mundo.

The First Days of Spring é assim um belo e melancólico testemunho de corações partidos, mas dispostos, em algum momento, a começar tudo de novo. A sonoridade é folk resvalando aqui e ali em tons orquestrais que só ampliam a intensidade das canções. Pelo menos uma delas, “Instrumental I” tem uma roupagem mais clássica, meio épica e próxima à erudição, com coro de orquestra e cordas e metais ensaiando pompa. Uma melodia que parece ter se inspirado na parte dedicada à primavera da famosa sinfonia “As Quatro Estações”, do italiano Antonio Vivaldi. Seu andamento febril evoca fortemente domingos de sol, piqueniques e crianças alegres correndo no gramado.

A grandiloqüência daquela música não é, porém, lugar comum neste trabalho do grupo londrino. O álbum de Noah and The Whale flerta mesmo é com a melancolia, mas sem ser, antes que isso espante aqueles que fogem de sons mais delicados e downtempo, estupefaciente. É uma tristeza tratada com ternura, com a abertura para uma virada de sentimentos e postura citada no início desta resenha. “The First Days of Springs”, a música que dá nome ao CD, por exemplo, começa marcial, com um tambor monolítico, e segue com uma linda melodia que, num crescendo, desaba em arranjo orquestral clareando um cenário que pendia para o glacial.

“Our Window” utiliza-se de um piano tristíssimo, em compasso preguiçoso, chamando a cumplicidade de um violão emotivo e de uma bateria doce e sossegada. A bonita composição rivaliza, em inspiração melódica e arranjo consistente, com “Blue Skies”, que ganhou um clipe e espaço nos hds da galera antenada com a boa música indie. “Esta é uma canção para qualquer um que tenha o coração partido”, avisa Fink, abrindo lá na frente um clarão de esperança e alegria: “Céus azuis estão chegando”. Corinho e pandeiro hippie ajudam a criar uma imagem positiva para acalentar aqueles feridos e desterrados pelo amor.

Os corações destruídos voltam na mediana “My Broken Heart", cujo grande problema é sua vocação para a monotonia, temática e sonora, depois de quatro músicas incandescentes e apaixonadas. Talvez, seja isso na verdade, o que incomoda um pouco no álbum. Essa coesão conceitual, centrada na perda amorosa, e o abuso de violões dedilhados e pianos açucarados dão canseira em certos momentos da audição. Não tiram, contudo, o mérito de uma obra densa, introspectiva e com honestidade poética. O talento de Noah and the Whale para a criação de canções de forte apelo dramático torna-se aqui evidente. Quem sabe no próximo disco, com todos do grupo vivendo grandes amores, tenhamos um trabalho com uma carga de otimismo transformada em canções para dançar sob o sol.

Cotação: 3

Junte os caquinhos:

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